AQUI TEMOS UMA PEQUENA HOMENAGEM AOS PRIMEIROS LIDERES DA HISTÓRIA DE POÇO BRANCO - RN, CONFIRA ABAIXO:
JOSÉ FRANCISCO DE SOUZA
José Francisco de Souza (foto), conhecido como Zé Igapó, nasceu em 22 de março de 1922 na cidade de Campina Grande, Paraíba. Filho de Antônio Francisco de Souza e Sebastiana Alves dos Santos, já os sete anos de idade veio residir em Extremoz/RN. Seus pais fizeram o seu registro de nascimento na cidade de Ceará Mirim. Em 1941, foi incorporado ao Exército Brasileiro e foi servir no 16º RI até o ano de 1945.
O dia 17/01/1942 teve uma grande importância na vida de Zé Igapó, pois foi a data em que conheceu sua “querida” Joaquina Cacheado de Souza, Dona Quininha. Nove meses depois, Zé Igapó e Dona Quininha oficializaram seu noivado e se preparavam para casar quando uma noticia inesperada poderia ter dado um destino diferente aos dois: Zé Igapó foi convocado pelo governo brasileiro a embarcar para a guerra, no Navio Santarém, ancorado no Rio de Janeiro-RJ.
Sua noiva e familiares ficaram “num mar de lágrimas” e preocupação com a possível ida de Zé Igapó para a Europa. Na época, não existia nem mesmo um telefone para que Zé Igapó avisasse aos familiares que havia sido dispensado da guerra, embora fosse continuar servindo em solo brasileiro em regime de prontidão. Em 10/11/1945, Zé Igapó se licenciou do exército e voltou a sua terra para se dedicar a realizar o seu casamento com Dona Quininha. A união conjugal dos dois ocorreu a 06/01/1946 e dela nasceram dez filhos.
Após o seu casamento, Zé Igapó veio morar em Natal, no bairro de Igapó. Daí surgiu o pseudônimo que o acompanhou por toda sua vida. Daí por diante, praticamente todos os fins-de-semana, Zé Igapó vinha a Poço Branco e, nas férias, passava mais de trinta dias por lá. A vocação para servir começou quando alguns jovens passaram a frequentar sua casa, em Natal, para poder estudar. Daí, Zé Igapó começou a abrir as portas de sua casa também para pessoas mais humildes que precisavam fazer tratamento médico na capital. Esses primeiros passos certamente colocaram Zé Igapó na vida pública de Poço Branco.
Enquanto Poço Branco pertencia a Taipu, Zé Igapó foi eleito por três vezes como vereador do grande município sempre com grandes votações. Mesmo enfrentando muita polêmica e discriminações dentro do próprio povoado, Zé Igapó conseguiu desmembrar, parte do que é hoje Poço Branco, para fazer parte de Bento Fernandes, em um acordo com o então prefeito Lídio Fernandes. Mas a luta para tornar Poço Branco uma cidade emancipada continuou por mais alguns anos. Naquela época, Zé Igapó conseguiu o inédito direito de implantar um abono família para aquelas com mais de quatro membros, em convênio com a LBA. Enfrentar tantos abismos e perseguições políticas expôs Zé Igapó e sua família a situações de dificuldades financeiras nos anos em que enfrentava, praticamente sozinho, os políticos fortes do estado e os adversários de sua região - situações particulares que, normalmente, a história não conta...
Até chegar o “Dia D” (26/07/1963), a luta de Zé Igapó por Poço Branco continuou com seu trabalho de registrar pessoas e realizar diversos casamentos para que fosse possível se criar a comarca de Poço Branco. Outro plano de Zé Igapó foi a criação de diversas escolas isoladas e a qualificação de pessoas da comunidade como professores. As mais importantes foram as escolas de Poço Branco, Lagoa do Serrote e Lagoa do Cravo. A qualificação dos professores foi feita em Natal, em dois importantes centros formadores pedagógicos: Externato Saturnino e Escola Ary Parreira (da Marinha do Brasil). Zé Igapó fazia questão de ajudar financeiramente a muito deles.
Entre os anos de 61 e 64, Zé Igapó travou outra luta para desmembrar parte de Poço Branco de Bento Fernandes e a outra parte de Taipu. Foi outra tarefa difícil e cheia de opositores, pois as populações dos dois municípios (e seus políticos) eram contrárias as idéias emancipacionistas de Zé igapó. Com a criação de várias escolas e do Cartório Único faltava a Zé Igapó mais prestígio junto ao Tribunal de Justiça do RN e ao Governo do Estado. O governador à época era o Sr. Aluízio Alves que apoiava o prefeito Vicente Cruz, de Taipu. Ambos eram contrários a emancipação de Poço Branco que somente ocorreu porque foi assinada pelo governador em exercício, Roberto Pereira Varela, na ausência do governador, Aluizio Alves, em viagem ao exterior, e do vice-governador, Monsenhor Walfredo Gurgel.
Mesmo quando Poço Branco foi emancipado, em 1963, alguns setores da política da região atribuíram o feito aos prefeitos de Taipu e de Bento Fernandes, afirmando que ambos teriam concordado com a emancipação de Poço Branco (naquele ano, outros 37 municípios do RN foram criados). Em 1965, o Dr. Valban de Farias foi eleito prefeito da cidade e o candidato de Zé Igapó (Ivan Cardoso) perdeu a eleição porque o Dr. Valban foi apoiado por Taipu, Bento Fernandes e pelo então governador do estado, Monsenhor Walfredo Gurgel. Quatro anos depois (1969), Zé Igapó foi eleito vice-prefeito de Poço Branco, já emancipado, juntamente com ao Sr. Ivan Cardoso para um mandato de 4 anos.
Em 1972, Zé Igapó perdeu as eleições para Joãozinho Cruz basicamente pelos mesmos motivos de anos anteriores: dissidências e desentendimentos políticos locais. Em 1976, ele se elegeu prefeito de Poço Branco para um mandato de seis anos. Neste período, conseguiu importantes conquistas para a cidade. Trouxe uma escola de 2º grau (José Francisco), a TELERN, CAERN, COSERN, CORREIOS e o Projeto Casulo (um pioneiro projeto de educação infantil). Construiu a Escola Maria de Lourdes Costa e um Posto de Saúde, em Contador, e as Escolas Isoladas dos Baixos e Samambaia. Zé Igapó reformou e ampliou o cemitério de Contador, reformou e reconstruiu casas residenciais, pertencentes à prefeitura, para reativar ou implantar escolas municipais. Ele também trouxe os primeiros médicos para residirem em Poço Branco, pois, antes, todos moravam fora da cidade.
Sua luta por Poço Branco trouxe empregos públicos para dezenas de poçobranquenses - até hoje, imagino, gratos por seus serviços. Sua residência na capital do estado era frequentada por muitos conterrâneos que não tinham como fazer um tratamento de saúde digno na sua cidade ou região. Sabe-se que as condições de transporte e das estradas eram precárias e muito diferentes das atuais. Por isso, era comum alguns passarem várias semanas em seu domicílio.
Com o fim de seu mandato, em 1982, e com seu deficitário estado de saúde, Zé Igapó voltou a morar na capital do estado, mas jamais deixou de frequentar a “sua querida Poço Branco”. Em 21/09/1983 ele viajou a capital paulista para realizar exames e se submeter a uma cirurgia cardíaca, muito complicada para as condições médicas da época. Em um dos poucos momentos de sua vida Zé Igapó não teve forças para lutar e veio a falecer naquela data. A seu pedido, foi sepultado na cidade que adotou como sua em 23/09/1983.
“Como criança, não lembro de tanta comoção pela morte de uma pessoa. Também ainda não havia visto o meu pai, Manoel Targino, chorar como naquele dia - juntamente com tantos outros amigos de Zé Igapó. Isso me deixou profundamente triste e, a partir daquela data, despertou-me o desejo de conhecer a história de Zé Igapó. Tive o privilégio de escoltar, como escoteiro, o caixão daquele ilustre (e ao mesmo tempo polêmico e injustiçado) poçobranquense até o cemitério público de Poço Branco, onde, hoje, ele descansa ao lado dos seus. Talvez Zé Igapó tivesse outra "face" que não conheci em minhas pesquisas e entrevistas por Poço Branco. Sou fã de Zé Igapó e sei que homens que dão a sua vida, a sua saúde, a sua intimidade, o seu lazer, a sua família (e outras coisas mais) por um ideal são raros. Tanto são que, acredito, não existem mais... Zé Igapó e seu jeito “agridoce” (agressivo + doce) infelizmente não 'fizeram escola' em Poço Branco, pois há tantos anos esforço-me para encontrar semelhanças suas em homens públicos daquela terra. Sinto que Poço Branco perdeu Zé Igapó e não recuperou alguém parecido. Não pelas vitórias ou derrotas políticas que sofreu, mas pela gana que tinha por conquistar seus objetivos. Ainda não vislumbrei nada parecido até então. Infelizmente”.
VICENTE FERREIRA DA CRUZ
Potiguar nascido em 23 de maio de 1912, em Taipu, na região do Mato Grande, Vicente Ferreira da Cruz era filho de agricultores, teve 29 irmãos e viveu com os pais, Antônio Ferreira da Cruz e Amélia Leopoldina da Cruz, até 1932. A partir deste ano ele se mudou para Poço Branco (ainda um pequeno povoado) e se instalou na rua da estrada da cidade, montando uma casinha de taipa e uma pequena bodega para vender cachaça. Com uma personalidade marcada pela inteligência, e mostrando-se sempre muito afável, o comerciante rapidamente conquistou freguesia e, 20 anos depois de ter chegado a Poço Branco, já era o homem mais rico da cidade. Porém, nem tudo foram flores. Contratempos chegaram a atingir Vicente. Em 1954, perdeu tudo em um incêndio. Porém, quatro anos depois, já estava comercialmente refeito.
Pode-se dizer, então, que Seu Vicente foi uma grande mola-mestra dessa época, “o pai dos pobres”, pois emprestava terra de graça, sem cobrar nada de arrendamento ou aluguel. E mais: quem não tinha dinheiro para financiar a lavoura, pegava emprestado com ele. Garantia, assim, o sustento das famílias dos agricultores. No inverno, Vicente cedia a terra, dava a comida e o crédito para a plantação. No verão, comprava toda a produção dos agricultores, deduzia o que havia emprestado e pagava o excedente que o povo acabava lhe devolvendo em compras no armazém. Foi assim que criou um sistema econômico que terminou por promovê-lo quase à categoria de banco. Chegou a um ponto que, praticamente, todos da cidade lhe deviam algum dinheiro. O algodão que ele comprava aos mais pobres era todo exportado para a cidade vizinha, João Câmara, onde mantinha contatos comerciais com seu primo, que deu nome à cidade e representou o grande expoente de desenvolvimento do Mato Grande.
Todo o prestígio adquirido através desse sistema econômico proporcionou a Seu Vicente um alto grau de influência e poder no povoado e na região, sendo figura de vanguarda para a época. Com um comportamento empreendedor nato e veia comercial forte, Vicente da Cruz acumulou riqueza. Quando a energia elétrica ainda nem existia no vilarejo, por volta de 1960, era do motor a óleo diesel da mercearia de Vicente da Cruz que saía a luz para a cidade inteira. Fornecia a luz de graça, até mesmo para os comércios concorrentes. Quando teve que mudar de lugar, Poço Branco ficou um bom tempo sem igreja. Era, então, na casa de Seu Vicente que eram rezadas as missas. Como era o único morador a possuir automóvel, também lhe cabia a missão de ir buscar o padre, em Taipu, porque não havia pároco em Poço Branco. O confessionário funcionava na sua garagem. Até Frei Damião se hospedou em sua casa o que deu muito respeito por parte de todos.
Foi Vicente o primeiro morador a comprar carro, em 1948. A chegada do automóvel tornou-se um evento. Era uma caminhoneta Ford/F1 (ZERO Km), adquirida numa revendedora do bairro da Ribeira, em Natal. Aliás, para chegar com a máquina em Poço Branco, Vicente teve que mandar construir a primeira estrada. Em sua casa, se instalou o primeiro rádio e mais tarde a primeira televisão de todo o distrito. Por ser o comerciante mais rico o poder financeiro o tornou também a liderança mais proeminente. Foi fazendeiro, delegado de polícia, juiz de paz, vereador e prefeito eleito de Taipu entre 1958 e 1962, quando Poço Branco ainda era um distrito. Um momento histórico no qual Vicente da Cruz destacou-se, confirmando a força de sua liderança, foi quando da construção da Barragem José Batista do Rego Pereira. A barragem era o segundo maior reservatório de água do RN e foi construída nos anos 60 pelo Departamento Nacional de Obras e Saneamento (DNOS) para regular as cheias do rio Ceará Mirim. As obras, que levaram 10 anos para serem concluídas, são a prova mais contundente da grandiosidade da biografia de Vicente da Cruz.
Tamires Miranda, primo e aliado político de Seu Vicente, participou da jornada política para que fossem conseguidas as verbas necessárias para a construção da Barragem de Poço Branco. Vicente da Cruz, com sua visão empreendedora, foi um dos idealizadores da represa. Tamires foi a Brasília para tentar junto ao Governo Federal o repasse da verba para a barragem. Enquanto isso, Seu Vicente permaneceu no RN trabalhando junto ao governo do Estado. Quando conseguiu o repasse, Tamires mandou um telegrama para Vicente informando da vitória. O repasse inicial foi feito e a Construtora Nóbrega Machado foi a responsável pela construção. Para se ter uma idéia, boa parte das pedras utilizadas na construção do imenso paredão capaz de represar 135 milhões de metros cúbicos de água saíram da fazenda dele. Seu Vicente cedeu todas as rochas de graça, sem cobrar nada. Uma das vezes que foi buscar o pagamento dos funcionários da Construtora, voltou com o seu Fusca cheio de dinheiro, acomodado em sacolas de papel. O fato tornou-se lenda na cidade e ainda é lembrado pelos moradores mais antigos de Poço Branco. Na construção do açude, ele manteve muitas pessoas fornecendo “vales”.
Em 1971, foi fundada a Maternidade Virgínia de Carvalho, em Poço Branco. Na época, Seu Vicente foi tesoureiro e, pela primeira vez, Dona Hilda Cruz, sua companheira, trabalhou fora de casa como diretora do órgão. O sistema “vicentino”, as dificuldades, as festas de fim de colheita, o “forró do armazém” foram os principais momentos que carimbam o nome de Vicente da Cruz como figura política de destaque da região. Já o fim do ciclo do algodão coincidiu com a época em que ele foi começando a perder dinheiro, prestígio e saúde.
MANOEL TARGINO SOBRINHO
Mais conhecido como MANÉ CAJU, ele nasceu em Poço Branco Velho em 13/09/1933, filho de ALMIRA GUEDES DA SILVA (BIBIA) e JOSÉ TARGINO GOMES (PAIÚ). MANÉ CAJU foi o primogênito de uma família de 8 (oito) filhos. Como era o mais velho tinha a obrigação de trabalhar no roçado e ajudar sua mãe a criar os irmãos mais novos. Naquele tempo não importava se o filho fosse homem ou mulher: todos tinham de pegar no “cabo da enxada”. BÉ ou EIÉ, como era chamado pelos irmãos e sobrinhos, teve uma infância difícil, mas de muita felicidade porque sempre manteve os irmãos unidos. Quando um deles tinha uma dificuldade era ele que tomava à frente.
Os anos se passaram e a vida em Poço Branco Velho só melhorava com a chegada de um bom inverno. No curso do rio havia poços e cachoeiras onde a população do povoado se reunia para tomar banho e mergulhar. Era esta mesma chuva que trazia algo ainda mais sagrado: uma boa colheita de feijão e milho. Era tudo com o que aquele povo mais sonhava... Na sua infância e juventude conquistou muitos amigos, como ZÉ DE FREITAS, ZÉ CAXIADO, ANTONIO MIRANDA, ÉRAQUIO ALVES, JOÃO MIGUEL, ZECA LUÍS, MILTON SALUSTINO, NENÉM COBÉ, RAIMUNDO CAXIADO além de muitos outros. Com certeza eles fizeram muitas estripulias, como é digno das crianças e dos jovens. Mas a infância e a adolescência não duram para sempre: em 1951, MANÉ CAJU veio servir ao exército, em Natal. Não seria uma tarefa fácil para um jovem do interior com pouca instrução e que andava quilômetros até chegar à parada do trem que lhe levaria até a capital.
A sua vontade e inteligência logo se destacariam no quartel. O Capitão de sua companhia o designou para servir no Hospital de Guarnição de Natal onde, por 5 anos, adquiriu conhecimentos em enfermagem prática. Em suas folgas, MANÉ CAJU ficava a observar os barbeiros cortarem o cabelo dos Praças e Oficiais do Exército e, com isso, aprendeu também o ofício da barbearia. Quando vinha de folga a Poço Branco Velho já aplicava umas injeções, cortava os cabelos e tirava a barba de alguns conhecidos.
Com a morte do patriarca (José Targino), MANÉ CAJU passou a fazer plenamente o papel de “pai de todos”. Ao pedir baixa do exército, em 1956, começou de fato a praticar aquilo que lhe tornaria um dos cidadãos mais importantes da história de Poço Branco. Por longos anos foi considerado “o médico" daquela cidade. De dia ou de noite, com chuva ou com sol, MANÉ CAJU não media esforços pra ir ao socorro de quem mais precisasse. É impossível contar quantas vezes ele deu uma injeção, passou uma pomada, ajudou num parto ou deu um comprimido...
O seu meio de transporte era um burrinho que muitos apelidavam de “o jipe de caju”. Usava também uma maleta de madeira onde levava todo material necessário para qualquer urgência, tais como seringas, esparadrapos, comprimidos, tesouras, etc. Poucas vezes cobrava pelo serviço, mas quando a família atendida tinha condições ele pedia o valor dos medicamentos. Tanto que o farmacêutico CELSO DUTRA, seu amigo e fornecedor de remédios, ainda em vida disse: “Manoel deveria ter ficado rico. Não sei por que era tão teimoso”.
Em Poço Branco, o amigo ELVIRO DE FREITAS disse: “Onde MANÉ CAJU passava o povo mais véio chamava ele pra almoçar ou jantar, mas os meninos faziam carreira com medo das injeção. Ele passou um remédio que curou um problema no meu braço”. Infelizmente, em pouco tempo a ganância e a inveja bateram nos olhos de alguns. Perseguido por gente sem escrúpulos foi impedido de continuar comercializando seus “remedinhos”, mesmo que o povo só confiasse nas receitas dele. Casou-se com a professora SEBASTIANA ROCHA TARGINO, em 08/01/72, com quem teve dois filhos. Para sobreviver e ajudar a criar seus filhos foi barbeiro no comércio de Poço Branco por muitos anos.
Convidado pelo amigo ZÉ IGAPÓ (e incentivado por amigos como NONATO e JOÃO CÂNDIDO) ingressou na política como candidato à vice-prefeito de Poço Branco, em 15/11/1972. Perdeu a eleição por 39 votos para JOÃOZINHO CRUZ e DONA MARIZA (fonte: TSE). Ainda em 1976 foi indicado, por ato institucional do governo federal, vereador da cidade por 4 anos. Em 15/11/1976 foi eleito com 136 votos para seu 2º mandato, entre os anos de 1977 e 1982.
MANÉ CAJU não foi um homem brilhante com as palavras nem com a escrita (tanto que não fazia discursos em palanques), mas tinha as qualidades que um homem público mais precisa: HONESTIDADE e DIGNIDADE. Ele não possuía apenas qualidades de homem público. Acima de tudo foi um PAI digno, justo e exigente quando preciso. No seu sepultamento foram muitos os testemunhos de seus atos tão simples quanto nobres e desprovidos de maiores interesses.
Tanta dedicação e presteza não lhe renderam riqueza. Levou alegria a muitos enfermos, mas o desencadear de sua vida lhe trouxe também tristezas e mágoas em seu coração. Em 1989 foi morar em Natal para estar mais perto de um tratamento médico digno, já que não encontrava em sua cidade querida. Em Poço Branco ele também trabalhou na Escola José Francisco Filho por 6 anos; em Natal, trabalhou por 14 anos na Escola Felizardo Moura, onde se aposentou aos 70 anos de idade. Após 20 anos de tratamento médico e de ter se tornado “refém de remédios” seu coração parou, às 18h do dia 29/05/2007, no Hospital Antônio Prudente (em Natal) como quis nosso DEUS TODO PODEROSO para seu destino.
Quis ainda o seu destino lhe sepultar ao lado de outro ícone poçobranquense: o médico FRANCISCO DE ASSIS DA SILVA (Dr. Assis). Como MANÉ CAJU, ASSIS também foi vereador e ajudou a curar e diminuir o sofrimento de muitos conterrâneos. Hoje, as novas gerações ainda não tiveram conhecimento dessa história e há alguns poucos que dizem que o trabalho de MANÉ CAJU era amador e sem qualificação. Mas era o que existia na época e fez muitas pessoas terem suas enfermidades curadas. Isso é fato e é o que importa.
DANIEL JUSTINO DA ROCHA
Nasceu em 3 de março de 1896, na fazenda Riacho do Cravo, distrito do Cravo, então pertencente ao município de Taipu/RN. Seus pais eram Joaquina Justino e José Justino da Rocha. Maria Rosa Rodrigues Alves (Mãe Rosa) nasceu em 1º de janeiro de 1901, na fazenda Cravo de Melancia, distrito do Cravo, então pertencente ao município de Taipu/RN. Seus pais eram Generosa Maria Rodrigues Alves e Francisco Alves. Após seu casamento ela passou a se chamar Maria Rosa da Rocha.
Casaram-se na Capela de Nossa Senhora do Livramento, na Cidade de Taipu/RN, em 25 de maio de 1919. Iniciaram sua vida conjugal indo morar na fazenda Lagoa do Cravo, onde hoje fica o distrito de Contador, município de Poço Branco/RN. Ele faleceu em 16 de dezembro de 1972, aos 76 anos. Ela em 5 de agosto de 2000, aos 99 anos. Ali constituíram sua família, formada pelos filhos:
Manoel Justino da Rocha (Mané Danié, in memorian); João da Rocha (João, in memorian); Maria da Rocha Silva (Lali, in memorian); José da Rocha (Zé Rocha, in memorian); Maria de Lourdes Silva (Bubú); Teófilo da Rocha (Tóta, in memorian); Francisca da Rocha de Macedo (Chichi); Isaura Rocha de Lima (Zarú); Sebastiana Rocha Targino (Babá); Emília Rocha de Lima (a maga) e Francisco de Assis da Rocha (Cuguinha).
Como quase toda tradicional família da época, a família do Sr. Daniel Justino criava bois, perus, cabras, galinhas, guinés e ovelhas e ainda cultivava o milho, feijão e mandioca. Após os períodos de inverno (plantio), começava a colheita do milho e feijão para estocar e também para vender nas feiras livres da região. A colheita da mandioca se dava após dois anos do seu plantio e a chamada “farinhada” chegava a durar de quatro e seis meses. No entanto, a produção não se restringia a farinha de mandioca: o beiju, a tapioca e a goma também serviam para alimentação e venda.
Nos períodos de bonança, muitos retirantes e ciganos se hospedavam no pátio e nos armazéns da casa de morada do Sr. Daniel Justino. Era comum muitos deles pedirem trabalho apenas em troca de alimentação. As principais festas da família eram religiosas: o São João, em junho, e São Francisco, em outubro. Nesta última, a família organizava uma novena e outros eventos folclóricos, como cantoria de viola, joão-redondo e boi de reis. Comidas típicas (canjica, pamonha, milho cozido, tapioca, bolo preto, etc.), galinha caipira, peru e carneiro (acompanhados de bata-doce, macaxeira, arroz e feijão) também eram oferecidos aos convidados do Sr. Daniel Justino e Dona Maria Rosa, pois era algo muito comum naquelas épocas.
Em vários períodos do ano as comunidades do Contador, Acauã, Lagoa do Juazeiro, Xavier e outros pequenos povoados costumavam comparecer a residência do Sr. Daniel Justino para participar da Festa de Vaquejada, festança realizada sempre nas tardes dos domingos. A organização da festa era responsabilidade de seus filhos, João Rocha e Zé Rocha.
JOSÉ CÍCERO DE OLIVEIRA
Conhecido na cidade como Cíço de Filó, este poçobranquense veio ao mundo no berço de sua cidade e relembra, com muita saudade, os bons tempos que viveu na sua infância e adolescência. As caçadas, a pesca farta, os roçados, as brincadeiras e, mais tarde, o futebol nos campos de barro batido jamais sairão da memória deste poçobranquense prestes a completar 75 anos de idade. “Tudo a gente plantava ou pegava e não precisava comprar quase nada. Hoje, se o bujão de casa secar o povo não cozinha nada”, lamenta Cíço.
Ele relembrou ainda o tempo em que era “um habilidoso ponta-direita” e jogava com Chico Ventinha, Cabo Zé, Canindé Fernandes, Cícero Luís, Chico Gonçalo, entre outros amigos. Citou que já existia bebida, mas ninguém brigava por causa do jogo ou por pouca coisa. “Havia amizade de verdade e quase todo mundo era compadre um do outro. Hoje, há muita falsidade e inveja nas amizades e a turma enche o pote por qualquer motivo”, destaca Cíço.
Pai de sete filhos, avô de dezesseis netos e bisavô de quatro bisnetos, Cíço de Filó “dar graças a Deus” ter o seu salário de aposentado garantido todo mês. Acha que o governo do presidente Lula contribuiu muito para melhorar a vida das pessoas mais pobres, mas acredita que falta mais oportunidades de trabalho para a juventude de Poço Branco – que cresce a cada dia. “Se tivesse uma fábrica por aqui, pra dar emprego à juventude, a vida ia melhorar para cada pai de família que tem de sustentar os seus filhos e até os netos. A gente ouve falar em lugares pequenos, mas que o povo tem emprego. Por aqui prefeitura até hoje só serviu pra dar boa vida a prefeito”, conclui o poçobranquense.
Cíço de Filó e sua esposa, Dona Edite, são pessoas simples, muito hospitaleiros e respeitadores – como é a grande família poçobranquense. São pessoas que, diariamente, dão sua contribuição para fomentar a economia e as relações sociais do município de Poço Branco. Mas, também são pessoas sem inserção social na comunidade, talvez por não dispuserem de poder econômico privilegiado ou ainda por não terem nenhuma formação intelectual. Discriminados ou esquecidos, não importa: eles são “GENTE DA GENTE”. São o que Poço Branco tem de melhor.
José Francisco de Souza (foto), conhecido como Zé Igapó, nasceu em 22 de março de 1922 na cidade de Campina Grande, Paraíba. Filho de Antônio Francisco de Souza e Sebastiana Alves dos Santos, já os sete anos de idade veio residir em Extremoz/RN. Seus pais fizeram o seu registro de nascimento na cidade de Ceará Mirim. Em 1941, foi incorporado ao Exército Brasileiro e foi servir no 16º RI até o ano de 1945.
O dia 17/01/1942 teve uma grande importância na vida de Zé Igapó, pois foi a data em que conheceu sua “querida” Joaquina Cacheado de Souza, Dona Quininha. Nove meses depois, Zé Igapó e Dona Quininha oficializaram seu noivado e se preparavam para casar quando uma noticia inesperada poderia ter dado um destino diferente aos dois: Zé Igapó foi convocado pelo governo brasileiro a embarcar para a guerra, no Navio Santarém, ancorado no Rio de Janeiro-RJ.
Sua noiva e familiares ficaram “num mar de lágrimas” e preocupação com a possível ida de Zé Igapó para a Europa. Na época, não existia nem mesmo um telefone para que Zé Igapó avisasse aos familiares que havia sido dispensado da guerra, embora fosse continuar servindo em solo brasileiro em regime de prontidão. Em 10/11/1945, Zé Igapó se licenciou do exército e voltou a sua terra para se dedicar a realizar o seu casamento com Dona Quininha. A união conjugal dos dois ocorreu a 06/01/1946 e dela nasceram dez filhos.
Após o seu casamento, Zé Igapó veio morar em Natal, no bairro de Igapó. Daí surgiu o pseudônimo que o acompanhou por toda sua vida. Daí por diante, praticamente todos os fins-de-semana, Zé Igapó vinha a Poço Branco e, nas férias, passava mais de trinta dias por lá. A vocação para servir começou quando alguns jovens passaram a frequentar sua casa, em Natal, para poder estudar. Daí, Zé Igapó começou a abrir as portas de sua casa também para pessoas mais humildes que precisavam fazer tratamento médico na capital. Esses primeiros passos certamente colocaram Zé Igapó na vida pública de Poço Branco.
Enquanto Poço Branco pertencia a Taipu, Zé Igapó foi eleito por três vezes como vereador do grande município sempre com grandes votações. Mesmo enfrentando muita polêmica e discriminações dentro do próprio povoado, Zé Igapó conseguiu desmembrar, parte do que é hoje Poço Branco, para fazer parte de Bento Fernandes, em um acordo com o então prefeito Lídio Fernandes. Mas a luta para tornar Poço Branco uma cidade emancipada continuou por mais alguns anos. Naquela época, Zé Igapó conseguiu o inédito direito de implantar um abono família para aquelas com mais de quatro membros, em convênio com a LBA. Enfrentar tantos abismos e perseguições políticas expôs Zé Igapó e sua família a situações de dificuldades financeiras nos anos em que enfrentava, praticamente sozinho, os políticos fortes do estado e os adversários de sua região - situações particulares que, normalmente, a história não conta...
Até chegar o “Dia D” (26/07/1963), a luta de Zé Igapó por Poço Branco continuou com seu trabalho de registrar pessoas e realizar diversos casamentos para que fosse possível se criar a comarca de Poço Branco. Outro plano de Zé Igapó foi a criação de diversas escolas isoladas e a qualificação de pessoas da comunidade como professores. As mais importantes foram as escolas de Poço Branco, Lagoa do Serrote e Lagoa do Cravo. A qualificação dos professores foi feita em Natal, em dois importantes centros formadores pedagógicos: Externato Saturnino e Escola Ary Parreira (da Marinha do Brasil). Zé Igapó fazia questão de ajudar financeiramente a muito deles.
Entre os anos de 61 e 64, Zé Igapó travou outra luta para desmembrar parte de Poço Branco de Bento Fernandes e a outra parte de Taipu. Foi outra tarefa difícil e cheia de opositores, pois as populações dos dois municípios (e seus políticos) eram contrárias as idéias emancipacionistas de Zé igapó. Com a criação de várias escolas e do Cartório Único faltava a Zé Igapó mais prestígio junto ao Tribunal de Justiça do RN e ao Governo do Estado. O governador à época era o Sr. Aluízio Alves que apoiava o prefeito Vicente Cruz, de Taipu. Ambos eram contrários a emancipação de Poço Branco que somente ocorreu porque foi assinada pelo governador em exercício, Roberto Pereira Varela, na ausência do governador, Aluizio Alves, em viagem ao exterior, e do vice-governador, Monsenhor Walfredo Gurgel.
Mesmo quando Poço Branco foi emancipado, em 1963, alguns setores da política da região atribuíram o feito aos prefeitos de Taipu e de Bento Fernandes, afirmando que ambos teriam concordado com a emancipação de Poço Branco (naquele ano, outros 37 municípios do RN foram criados). Em 1965, o Dr. Valban de Farias foi eleito prefeito da cidade e o candidato de Zé Igapó (Ivan Cardoso) perdeu a eleição porque o Dr. Valban foi apoiado por Taipu, Bento Fernandes e pelo então governador do estado, Monsenhor Walfredo Gurgel. Quatro anos depois (1969), Zé Igapó foi eleito vice-prefeito de Poço Branco, já emancipado, juntamente com ao Sr. Ivan Cardoso para um mandato de 4 anos.
Em 1972, Zé Igapó perdeu as eleições para Joãozinho Cruz basicamente pelos mesmos motivos de anos anteriores: dissidências e desentendimentos políticos locais. Em 1976, ele se elegeu prefeito de Poço Branco para um mandato de seis anos. Neste período, conseguiu importantes conquistas para a cidade. Trouxe uma escola de 2º grau (José Francisco), a TELERN, CAERN, COSERN, CORREIOS e o Projeto Casulo (um pioneiro projeto de educação infantil). Construiu a Escola Maria de Lourdes Costa e um Posto de Saúde, em Contador, e as Escolas Isoladas dos Baixos e Samambaia. Zé Igapó reformou e ampliou o cemitério de Contador, reformou e reconstruiu casas residenciais, pertencentes à prefeitura, para reativar ou implantar escolas municipais. Ele também trouxe os primeiros médicos para residirem em Poço Branco, pois, antes, todos moravam fora da cidade.
Sua luta por Poço Branco trouxe empregos públicos para dezenas de poçobranquenses - até hoje, imagino, gratos por seus serviços. Sua residência na capital do estado era frequentada por muitos conterrâneos que não tinham como fazer um tratamento de saúde digno na sua cidade ou região. Sabe-se que as condições de transporte e das estradas eram precárias e muito diferentes das atuais. Por isso, era comum alguns passarem várias semanas em seu domicílio.
Com o fim de seu mandato, em 1982, e com seu deficitário estado de saúde, Zé Igapó voltou a morar na capital do estado, mas jamais deixou de frequentar a “sua querida Poço Branco”. Em 21/09/1983 ele viajou a capital paulista para realizar exames e se submeter a uma cirurgia cardíaca, muito complicada para as condições médicas da época. Em um dos poucos momentos de sua vida Zé Igapó não teve forças para lutar e veio a falecer naquela data. A seu pedido, foi sepultado na cidade que adotou como sua em 23/09/1983.
“Como criança, não lembro de tanta comoção pela morte de uma pessoa. Também ainda não havia visto o meu pai, Manoel Targino, chorar como naquele dia - juntamente com tantos outros amigos de Zé Igapó. Isso me deixou profundamente triste e, a partir daquela data, despertou-me o desejo de conhecer a história de Zé Igapó. Tive o privilégio de escoltar, como escoteiro, o caixão daquele ilustre (e ao mesmo tempo polêmico e injustiçado) poçobranquense até o cemitério público de Poço Branco, onde, hoje, ele descansa ao lado dos seus. Talvez Zé Igapó tivesse outra "face" que não conheci em minhas pesquisas e entrevistas por Poço Branco. Sou fã de Zé Igapó e sei que homens que dão a sua vida, a sua saúde, a sua intimidade, o seu lazer, a sua família (e outras coisas mais) por um ideal são raros. Tanto são que, acredito, não existem mais... Zé Igapó e seu jeito “agridoce” (agressivo + doce) infelizmente não 'fizeram escola' em Poço Branco, pois há tantos anos esforço-me para encontrar semelhanças suas em homens públicos daquela terra. Sinto que Poço Branco perdeu Zé Igapó e não recuperou alguém parecido. Não pelas vitórias ou derrotas políticas que sofreu, mas pela gana que tinha por conquistar seus objetivos. Ainda não vislumbrei nada parecido até então. Infelizmente”.
VICENTE FERREIRA DA CRUZ
Potiguar nascido em 23 de maio de 1912, em Taipu, na região do Mato Grande, Vicente Ferreira da Cruz era filho de agricultores, teve 29 irmãos e viveu com os pais, Antônio Ferreira da Cruz e Amélia Leopoldina da Cruz, até 1932. A partir deste ano ele se mudou para Poço Branco (ainda um pequeno povoado) e se instalou na rua da estrada da cidade, montando uma casinha de taipa e uma pequena bodega para vender cachaça. Com uma personalidade marcada pela inteligência, e mostrando-se sempre muito afável, o comerciante rapidamente conquistou freguesia e, 20 anos depois de ter chegado a Poço Branco, já era o homem mais rico da cidade. Porém, nem tudo foram flores. Contratempos chegaram a atingir Vicente. Em 1954, perdeu tudo em um incêndio. Porém, quatro anos depois, já estava comercialmente refeito.
Pode-se dizer, então, que Seu Vicente foi uma grande mola-mestra dessa época, “o pai dos pobres”, pois emprestava terra de graça, sem cobrar nada de arrendamento ou aluguel. E mais: quem não tinha dinheiro para financiar a lavoura, pegava emprestado com ele. Garantia, assim, o sustento das famílias dos agricultores. No inverno, Vicente cedia a terra, dava a comida e o crédito para a plantação. No verão, comprava toda a produção dos agricultores, deduzia o que havia emprestado e pagava o excedente que o povo acabava lhe devolvendo em compras no armazém. Foi assim que criou um sistema econômico que terminou por promovê-lo quase à categoria de banco. Chegou a um ponto que, praticamente, todos da cidade lhe deviam algum dinheiro. O algodão que ele comprava aos mais pobres era todo exportado para a cidade vizinha, João Câmara, onde mantinha contatos comerciais com seu primo, que deu nome à cidade e representou o grande expoente de desenvolvimento do Mato Grande.
Todo o prestígio adquirido através desse sistema econômico proporcionou a Seu Vicente um alto grau de influência e poder no povoado e na região, sendo figura de vanguarda para a época. Com um comportamento empreendedor nato e veia comercial forte, Vicente da Cruz acumulou riqueza. Quando a energia elétrica ainda nem existia no vilarejo, por volta de 1960, era do motor a óleo diesel da mercearia de Vicente da Cruz que saía a luz para a cidade inteira. Fornecia a luz de graça, até mesmo para os comércios concorrentes. Quando teve que mudar de lugar, Poço Branco ficou um bom tempo sem igreja. Era, então, na casa de Seu Vicente que eram rezadas as missas. Como era o único morador a possuir automóvel, também lhe cabia a missão de ir buscar o padre, em Taipu, porque não havia pároco em Poço Branco. O confessionário funcionava na sua garagem. Até Frei Damião se hospedou em sua casa o que deu muito respeito por parte de todos.
Foi Vicente o primeiro morador a comprar carro, em 1948. A chegada do automóvel tornou-se um evento. Era uma caminhoneta Ford/F1 (ZERO Km), adquirida numa revendedora do bairro da Ribeira, em Natal. Aliás, para chegar com a máquina em Poço Branco, Vicente teve que mandar construir a primeira estrada. Em sua casa, se instalou o primeiro rádio e mais tarde a primeira televisão de todo o distrito. Por ser o comerciante mais rico o poder financeiro o tornou também a liderança mais proeminente. Foi fazendeiro, delegado de polícia, juiz de paz, vereador e prefeito eleito de Taipu entre 1958 e 1962, quando Poço Branco ainda era um distrito. Um momento histórico no qual Vicente da Cruz destacou-se, confirmando a força de sua liderança, foi quando da construção da Barragem José Batista do Rego Pereira. A barragem era o segundo maior reservatório de água do RN e foi construída nos anos 60 pelo Departamento Nacional de Obras e Saneamento (DNOS) para regular as cheias do rio Ceará Mirim. As obras, que levaram 10 anos para serem concluídas, são a prova mais contundente da grandiosidade da biografia de Vicente da Cruz.
Tamires Miranda, primo e aliado político de Seu Vicente, participou da jornada política para que fossem conseguidas as verbas necessárias para a construção da Barragem de Poço Branco. Vicente da Cruz, com sua visão empreendedora, foi um dos idealizadores da represa. Tamires foi a Brasília para tentar junto ao Governo Federal o repasse da verba para a barragem. Enquanto isso, Seu Vicente permaneceu no RN trabalhando junto ao governo do Estado. Quando conseguiu o repasse, Tamires mandou um telegrama para Vicente informando da vitória. O repasse inicial foi feito e a Construtora Nóbrega Machado foi a responsável pela construção. Para se ter uma idéia, boa parte das pedras utilizadas na construção do imenso paredão capaz de represar 135 milhões de metros cúbicos de água saíram da fazenda dele. Seu Vicente cedeu todas as rochas de graça, sem cobrar nada. Uma das vezes que foi buscar o pagamento dos funcionários da Construtora, voltou com o seu Fusca cheio de dinheiro, acomodado em sacolas de papel. O fato tornou-se lenda na cidade e ainda é lembrado pelos moradores mais antigos de Poço Branco. Na construção do açude, ele manteve muitas pessoas fornecendo “vales”.
Em 1971, foi fundada a Maternidade Virgínia de Carvalho, em Poço Branco. Na época, Seu Vicente foi tesoureiro e, pela primeira vez, Dona Hilda Cruz, sua companheira, trabalhou fora de casa como diretora do órgão. O sistema “vicentino”, as dificuldades, as festas de fim de colheita, o “forró do armazém” foram os principais momentos que carimbam o nome de Vicente da Cruz como figura política de destaque da região. Já o fim do ciclo do algodão coincidiu com a época em que ele foi começando a perder dinheiro, prestígio e saúde.
MANOEL TARGINO SOBRINHO
Mais conhecido como MANÉ CAJU, ele nasceu em Poço Branco Velho em 13/09/1933, filho de ALMIRA GUEDES DA SILVA (BIBIA) e JOSÉ TARGINO GOMES (PAIÚ). MANÉ CAJU foi o primogênito de uma família de 8 (oito) filhos. Como era o mais velho tinha a obrigação de trabalhar no roçado e ajudar sua mãe a criar os irmãos mais novos. Naquele tempo não importava se o filho fosse homem ou mulher: todos tinham de pegar no “cabo da enxada”. BÉ ou EIÉ, como era chamado pelos irmãos e sobrinhos, teve uma infância difícil, mas de muita felicidade porque sempre manteve os irmãos unidos. Quando um deles tinha uma dificuldade era ele que tomava à frente.
Os anos se passaram e a vida em Poço Branco Velho só melhorava com a chegada de um bom inverno. No curso do rio havia poços e cachoeiras onde a população do povoado se reunia para tomar banho e mergulhar. Era esta mesma chuva que trazia algo ainda mais sagrado: uma boa colheita de feijão e milho. Era tudo com o que aquele povo mais sonhava... Na sua infância e juventude conquistou muitos amigos, como ZÉ DE FREITAS, ZÉ CAXIADO, ANTONIO MIRANDA, ÉRAQUIO ALVES, JOÃO MIGUEL, ZECA LUÍS, MILTON SALUSTINO, NENÉM COBÉ, RAIMUNDO CAXIADO além de muitos outros. Com certeza eles fizeram muitas estripulias, como é digno das crianças e dos jovens. Mas a infância e a adolescência não duram para sempre: em 1951, MANÉ CAJU veio servir ao exército, em Natal. Não seria uma tarefa fácil para um jovem do interior com pouca instrução e que andava quilômetros até chegar à parada do trem que lhe levaria até a capital.
A sua vontade e inteligência logo se destacariam no quartel. O Capitão de sua companhia o designou para servir no Hospital de Guarnição de Natal onde, por 5 anos, adquiriu conhecimentos em enfermagem prática. Em suas folgas, MANÉ CAJU ficava a observar os barbeiros cortarem o cabelo dos Praças e Oficiais do Exército e, com isso, aprendeu também o ofício da barbearia. Quando vinha de folga a Poço Branco Velho já aplicava umas injeções, cortava os cabelos e tirava a barba de alguns conhecidos.
Com a morte do patriarca (José Targino), MANÉ CAJU passou a fazer plenamente o papel de “pai de todos”. Ao pedir baixa do exército, em 1956, começou de fato a praticar aquilo que lhe tornaria um dos cidadãos mais importantes da história de Poço Branco. Por longos anos foi considerado “o médico" daquela cidade. De dia ou de noite, com chuva ou com sol, MANÉ CAJU não media esforços pra ir ao socorro de quem mais precisasse. É impossível contar quantas vezes ele deu uma injeção, passou uma pomada, ajudou num parto ou deu um comprimido...
O seu meio de transporte era um burrinho que muitos apelidavam de “o jipe de caju”. Usava também uma maleta de madeira onde levava todo material necessário para qualquer urgência, tais como seringas, esparadrapos, comprimidos, tesouras, etc. Poucas vezes cobrava pelo serviço, mas quando a família atendida tinha condições ele pedia o valor dos medicamentos. Tanto que o farmacêutico CELSO DUTRA, seu amigo e fornecedor de remédios, ainda em vida disse: “Manoel deveria ter ficado rico. Não sei por que era tão teimoso”.
Em Poço Branco, o amigo ELVIRO DE FREITAS disse: “Onde MANÉ CAJU passava o povo mais véio chamava ele pra almoçar ou jantar, mas os meninos faziam carreira com medo das injeção. Ele passou um remédio que curou um problema no meu braço”. Infelizmente, em pouco tempo a ganância e a inveja bateram nos olhos de alguns. Perseguido por gente sem escrúpulos foi impedido de continuar comercializando seus “remedinhos”, mesmo que o povo só confiasse nas receitas dele. Casou-se com a professora SEBASTIANA ROCHA TARGINO, em 08/01/72, com quem teve dois filhos. Para sobreviver e ajudar a criar seus filhos foi barbeiro no comércio de Poço Branco por muitos anos.
Convidado pelo amigo ZÉ IGAPÓ (e incentivado por amigos como NONATO e JOÃO CÂNDIDO) ingressou na política como candidato à vice-prefeito de Poço Branco, em 15/11/1972. Perdeu a eleição por 39 votos para JOÃOZINHO CRUZ e DONA MARIZA (fonte: TSE). Ainda em 1976 foi indicado, por ato institucional do governo federal, vereador da cidade por 4 anos. Em 15/11/1976 foi eleito com 136 votos para seu 2º mandato, entre os anos de 1977 e 1982.
MANÉ CAJU não foi um homem brilhante com as palavras nem com a escrita (tanto que não fazia discursos em palanques), mas tinha as qualidades que um homem público mais precisa: HONESTIDADE e DIGNIDADE. Ele não possuía apenas qualidades de homem público. Acima de tudo foi um PAI digno, justo e exigente quando preciso. No seu sepultamento foram muitos os testemunhos de seus atos tão simples quanto nobres e desprovidos de maiores interesses.
Tanta dedicação e presteza não lhe renderam riqueza. Levou alegria a muitos enfermos, mas o desencadear de sua vida lhe trouxe também tristezas e mágoas em seu coração. Em 1989 foi morar em Natal para estar mais perto de um tratamento médico digno, já que não encontrava em sua cidade querida. Em Poço Branco ele também trabalhou na Escola José Francisco Filho por 6 anos; em Natal, trabalhou por 14 anos na Escola Felizardo Moura, onde se aposentou aos 70 anos de idade. Após 20 anos de tratamento médico e de ter se tornado “refém de remédios” seu coração parou, às 18h do dia 29/05/2007, no Hospital Antônio Prudente (em Natal) como quis nosso DEUS TODO PODEROSO para seu destino.
Quis ainda o seu destino lhe sepultar ao lado de outro ícone poçobranquense: o médico FRANCISCO DE ASSIS DA SILVA (Dr. Assis). Como MANÉ CAJU, ASSIS também foi vereador e ajudou a curar e diminuir o sofrimento de muitos conterrâneos. Hoje, as novas gerações ainda não tiveram conhecimento dessa história e há alguns poucos que dizem que o trabalho de MANÉ CAJU era amador e sem qualificação. Mas era o que existia na época e fez muitas pessoas terem suas enfermidades curadas. Isso é fato e é o que importa.
DANIEL JUSTINO DA ROCHA
Nasceu em 3 de março de 1896, na fazenda Riacho do Cravo, distrito do Cravo, então pertencente ao município de Taipu/RN. Seus pais eram Joaquina Justino e José Justino da Rocha. Maria Rosa Rodrigues Alves (Mãe Rosa) nasceu em 1º de janeiro de 1901, na fazenda Cravo de Melancia, distrito do Cravo, então pertencente ao município de Taipu/RN. Seus pais eram Generosa Maria Rodrigues Alves e Francisco Alves. Após seu casamento ela passou a se chamar Maria Rosa da Rocha.
Casaram-se na Capela de Nossa Senhora do Livramento, na Cidade de Taipu/RN, em 25 de maio de 1919. Iniciaram sua vida conjugal indo morar na fazenda Lagoa do Cravo, onde hoje fica o distrito de Contador, município de Poço Branco/RN. Ele faleceu em 16 de dezembro de 1972, aos 76 anos. Ela em 5 de agosto de 2000, aos 99 anos. Ali constituíram sua família, formada pelos filhos:
Manoel Justino da Rocha (Mané Danié, in memorian); João da Rocha (João, in memorian); Maria da Rocha Silva (Lali, in memorian); José da Rocha (Zé Rocha, in memorian); Maria de Lourdes Silva (Bubú); Teófilo da Rocha (Tóta, in memorian); Francisca da Rocha de Macedo (Chichi); Isaura Rocha de Lima (Zarú); Sebastiana Rocha Targino (Babá); Emília Rocha de Lima (a maga) e Francisco de Assis da Rocha (Cuguinha).
Como quase toda tradicional família da época, a família do Sr. Daniel Justino criava bois, perus, cabras, galinhas, guinés e ovelhas e ainda cultivava o milho, feijão e mandioca. Após os períodos de inverno (plantio), começava a colheita do milho e feijão para estocar e também para vender nas feiras livres da região. A colheita da mandioca se dava após dois anos do seu plantio e a chamada “farinhada” chegava a durar de quatro e seis meses. No entanto, a produção não se restringia a farinha de mandioca: o beiju, a tapioca e a goma também serviam para alimentação e venda.
Nos períodos de bonança, muitos retirantes e ciganos se hospedavam no pátio e nos armazéns da casa de morada do Sr. Daniel Justino. Era comum muitos deles pedirem trabalho apenas em troca de alimentação. As principais festas da família eram religiosas: o São João, em junho, e São Francisco, em outubro. Nesta última, a família organizava uma novena e outros eventos folclóricos, como cantoria de viola, joão-redondo e boi de reis. Comidas típicas (canjica, pamonha, milho cozido, tapioca, bolo preto, etc.), galinha caipira, peru e carneiro (acompanhados de bata-doce, macaxeira, arroz e feijão) também eram oferecidos aos convidados do Sr. Daniel Justino e Dona Maria Rosa, pois era algo muito comum naquelas épocas.
Em vários períodos do ano as comunidades do Contador, Acauã, Lagoa do Juazeiro, Xavier e outros pequenos povoados costumavam comparecer a residência do Sr. Daniel Justino para participar da Festa de Vaquejada, festança realizada sempre nas tardes dos domingos. A organização da festa era responsabilidade de seus filhos, João Rocha e Zé Rocha.
JOSÉ CÍCERO DE OLIVEIRA
Conhecido na cidade como Cíço de Filó, este poçobranquense veio ao mundo no berço de sua cidade e relembra, com muita saudade, os bons tempos que viveu na sua infância e adolescência. As caçadas, a pesca farta, os roçados, as brincadeiras e, mais tarde, o futebol nos campos de barro batido jamais sairão da memória deste poçobranquense prestes a completar 75 anos de idade. “Tudo a gente plantava ou pegava e não precisava comprar quase nada. Hoje, se o bujão de casa secar o povo não cozinha nada”, lamenta Cíço.
Ele relembrou ainda o tempo em que era “um habilidoso ponta-direita” e jogava com Chico Ventinha, Cabo Zé, Canindé Fernandes, Cícero Luís, Chico Gonçalo, entre outros amigos. Citou que já existia bebida, mas ninguém brigava por causa do jogo ou por pouca coisa. “Havia amizade de verdade e quase todo mundo era compadre um do outro. Hoje, há muita falsidade e inveja nas amizades e a turma enche o pote por qualquer motivo”, destaca Cíço.
Pai de sete filhos, avô de dezesseis netos e bisavô de quatro bisnetos, Cíço de Filó “dar graças a Deus” ter o seu salário de aposentado garantido todo mês. Acha que o governo do presidente Lula contribuiu muito para melhorar a vida das pessoas mais pobres, mas acredita que falta mais oportunidades de trabalho para a juventude de Poço Branco – que cresce a cada dia. “Se tivesse uma fábrica por aqui, pra dar emprego à juventude, a vida ia melhorar para cada pai de família que tem de sustentar os seus filhos e até os netos. A gente ouve falar em lugares pequenos, mas que o povo tem emprego. Por aqui prefeitura até hoje só serviu pra dar boa vida a prefeito”, conclui o poçobranquense.
Cíço de Filó e sua esposa, Dona Edite, são pessoas simples, muito hospitaleiros e respeitadores – como é a grande família poçobranquense. São pessoas que, diariamente, dão sua contribuição para fomentar a economia e as relações sociais do município de Poço Branco. Mas, também são pessoas sem inserção social na comunidade, talvez por não dispuserem de poder econômico privilegiado ou ainda por não terem nenhuma formação intelectual. Discriminados ou esquecidos, não importa: eles são “GENTE DA GENTE”. São o que Poço Branco tem de melhor.